Por Fabrício Guimarães Pereira
O que é a Judicialização da Saúde?
Entende-se como judicialização da saúde, quando o paciente busca o Judiciário como a última alternativa para obtenção do medicamento ou tratamento que foi negado pelo SUS ou Plano de Saúde. Todo processo judicial começa após uma NEGATIVA administrativa, ou seja, o cidadão vai até o órgão público (farmácia da prefeitura, hospital, etc.) ou à operadora de plano de saúde, com uma PRESCRIÇÃO MÉDICA e solicita um MEDICAMENTO, tratamento ou outra tecnologia em saúde.
Havendo fornecimento do pedido, geralmente o caso se encerra. Havendo NEGATIVA da solicitação, o paciente pode buscar seu direito na justiça, por meio de um processo JUDICIAL.
Que tipo de medicamento pode ser judicializado?
Nós podemos dividir em dois tipos: 1) Processos Judiciais para fornecimento de medicamentos previstos nas listas publicas (Relação de Medicamentos Municipal Estadual ou Nacional) e que já foram incorporados e pactuados no SUS, e 2) Processos Judiciais para fornecimento de medicamentos não previstos nas listas publicas, que não foram incorporados no SUS, geralmente de alto ou altíssimo custo, como medicamentos experimentais, medicamentos de uso off label, medicamentos sem registro na ANVISA, medicamentos sem evidência ou com evidência duvidosa e medicamentos sem custo-efetividade.
Quais são as possibilidades de atuação dos farmacêuticos?
Podemos estabelecer três fases de intervenção dos farmacêuticos, relacionadas com os impactos na diminuição ou qualificação das demandas de medicamentos pelo via judicial. A primeira Fase é a fase Administrativa, relacionada com o ciclo da assistência farmacêutica, com as possibilidades de atuação dos farmacêuticos organizando a AF, emitindo pareceres técnicos e atuando na comissão de farmácia e terapêutica com a consequente definição de uma Relação municipal de Medicamentos Essenciais, a Remume, definindo claramente quais os medicamentos serão oferecidos na rede, definido a responsabilidade do município em manter esses medicamentos disponíveis. É nessa fase que podem ocorrer faltas, por alguma desorganização da AF do município ou surgir uma prescrição para um medicamento fora de lista, gerando um processo judicial. Ainda, antes de existir um processo judicial, teremos a Fase pré-processual, com ocorre aqui no RS, onde temos farmacêutica concursada atuando na Defensoria Publica do Estado, auxiliando os defensores públicos a resolverem as demandas ainda na fase administrativa, evitando que se instale um processo judicial. Por fim, quando já existe um processo tramitando, ou seja, na Fase processual, os juízes podem solicitar um parecer técnico ao Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário, os chamados NAT-JUS, compostos por farmacêuticos e outros profissionais da saúde, emitindo pareceres técnicos onde o juiz utilizará para tomar a decisão se concede ou não determinado medicamento.
A judicialização da saúde, apesar de ser um enorme problema, também pode ser entendida como uma oportunidade para os farmacêuticos?
Sim, essa é a conclusão que chegamos. O grave problema da judicialização da saúde, traz conseqüências negativas para os dois sistemas, saúde e justiça.
O sistema de saúde sofre com a escassez de recursos financeiros, não consegue atender todas as demandas e agora tem de enfrentar ações judiciais movimentando recursos previstos para atender toda uma política publico, direcionando recursos para poucos pacientes. No sistema de Justiça, onde tramitam mais 2.300.000 Processos Judiciais na área da Saúde, devemos lembrar que cada um desses processo também tem um custo de tramitação dentro do tribunal. Dependendo do tribunal, em cada estado da federação, estadual ou federal, podemos ter um custo na sua tramitação, pois envolve toda a máquina do judiciário, de cerca de dois a quatro mil reais em cada processo. Eventualmente podemos os ter um processo que custou quatro mil reais para conceder um medicamento que custa duzentos reais, por exemplo.
Então, os dois sistemas necessitam de ações para reduzir esse quadro, e os farmacêuticos se apresentam. Primeiro, os gestores públicos, com esse contexto, percebem toda a importância da AF, todo seu impacto na saúde das pessoas e nas finanças do município, então percebem que devem investir na gestão, nos recursos humanos, na organização, na capacitação, etc., ou seja, tudo aquilo que nós farmacêuticos sempre dissemos aos gestores, agora, com a judicialização, eles começam a entender e valorizar a profissão farmacêutica. E no Sistema de Justiça também, aqui no Rio Grande do Sul, por exemplo, o Conselho Regional de Farmácia (CRF-RS) é membro do Comitê Executivo da Saúde do CNJ/RS, onde eu sou dois representantes, onde se trata das demandas judiciais que envolvem a assistência à saúde no Estado. Participando do Comitê, juntamente com as instituições do sistema de Justiça e sistema de Saúde (Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, Corregedoria do Tribunal de Justiça, ministérios públicos Estadual e Federal, Justiça Federal, AGU, defensorias públicas Estadual e Federal, secretarias de Saúde Estadual e dos Municípios, entre outros) executamos um trabalho de planejamento de gestão sistêmica e conseguimos identificar a oportunidade de trabalho cooperativo com a Defensoria Pública do Rio Grane do Sul, firmando um Termo de Cooperação Técnica, em que o CRF-RS cedeu um profissional farmacêutico para atuar na Unidade Central de Atendimento e Ajuizamento da DPE-RS, junto aos defensores públicos. Este trabalho foi tão efetivo, gerando como resultados a diminuição de processos ajuizados pelos defensores públicos, obtendo tamanho reconhecimento à capacidade profissional do farmacêutico, que culminou com a criação do cargo de analista técnico farmacêutico para o quadro da instituição, e vagas em concurso publico.
Visibilidade
A judicialização da saúde, portanto, deu grande visibilidade aos farmacêuticos, também nas demais instituições que compõe o sistema de justiça. A competência técnica dos farmacêuticos atuantes nos NAT-JUS, foi comprovada com os pareceres e notas técnicas emitidas, baseadas nas melhores evidencias científicas, auxiliando nas decisões judiciais.
Além disso, as instituições do sistema de justiça, como Ministério Publico, e os órgãos de controle, como os tribunais de contas, já identificam os reflexos da desorganização da AF, em alguns municípios, já reconhecem que não pode existir uma AF adequada sem farmacêuticos em numero suficiente, e assim, passam a exigir as adequações e ampliação da AF, com mais contratações de farmacêuticos, ou seja, já não são os próprios farmacêuticos exigindo tudo isso,agora temos uma força muito maior para avançarmos e adequarmos a AF, com os consequentes benefícios aos pacientes e também a diminuição da judicialização da saúde.
Fonte: Conselho Nacional de Justiça.
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